Um dia normal começa mais ou menos com o seguinte:
Meu filho de 6 meses nos acorda bem cedinho – prodígio, está muito à frente do “5AM Club” – e nós brincamos até ele dormir de novo, uma hora depois. Eu aproveito para fazer uns 20 minutos de exercícios (que serão substituídos por uma corrida quando eu tiver a roupa certa para ir a -10 graus) e medito. Termino bem na hora que ele acorda de novo. Agora iniciamos o dia oficialmente, com bagunça e música da Disney no café da manhã. Em seguida é banho e dependendo da situação da pandemia, vou andando para o escritório (15 minutos) ou para o home office (15 segundos).
Isso tudo é para dizer que a fase de mudança passou e aparentemente entramos numa rotina aqui em Tallinn. Agora, dois meses desde a minha vinda para cá, estou atingindo aquela marca definida pelo “E aí, já se adaptou?”
Esta é uma pergunta que não vem só dos amigos, mas de mim também. “Como estou indo?” Ainda não consigo dar uma resposta curta, então aqui vai a versão longa.
Para começar, quando fazemos uma mudança de 11,2 mil quilômetros, o corpo chega rápido, mas a cabeça só vai entendendo aos poucos. Hello! Tere! Aitäh! Where am I? Você acorda e o céu está escuro. Faz tudo, se arruma e sai de casa duas horas depois – continua tudo escuro. Mas isso faz parte no inverno. O sol vai nascendo no caminho, revelando castelos no horizonte que (bem devagar) vão se tornando algo normal. Aliás, o cenário como um todo é incrível, cheio de neve, casas coloridas sem muro e criancinhas andando de trenó. A verdade é que tudo é tão novo que você assimila com um sorriso no rosto. E o frio? Uma questão de levar o casaco certo (o que, se a sua mãe é como a minha, você não esquece).
Mas também tem algumas coisas que levam mais tempo. No supermercado eu continuo sendo o cara esquisito apontando um celular para todo canto, tentando desvendar o estoniano com meu Google Translate. Tá aí um App que salva. E depois tem os desafios da parte falada: no trabalho, embora todos sejam fluentes em inglês, temos pessoas do mundo inteiro e este não é o idioma nativo para a maioria de nós. Então a comunicação em geral é bem mais simples e objetiva, talvez a fim de evitar os inevitáveis ruídos. Confesso que sinto falta daquela “resenha” de escritório (algo que já estou trabalhando para implantar na Bolt). Mas tudo tem um lado bom: as interações vão mais direto ao ponto e sinto que aqui somos bem mais produtivos.
E falando em produzir, não posso deixar de mencionar o trabalho em si. Estou enfrentando desafios de todo tipo: alguns velhos conhecidos e outros mais novos e complicados.
Em 2015 eu entrei em Vendas e desde então trabalho nessa mesma área, em startups focadas em plataformas de logística. Nesse aspecto estou em casa. Mas por outro lado, neste meu novo escopo global, em alguns momentos sinto que estou entrando em outro mundo. E mesmo quando vejo problemas familiares, tento manter meu mindset de iniciante. Encarar como se fosse a primeira vez. Afinal já sei que nesse mercado tão dinâmico a experiência conta menos do que a capacidade de aprender.
Há algumas semanas comecei a participar de processos seletivos por aqui. Contratar é a atividade mais importante de qualquer empresa e algo que eu sempre fiz e gostei de fazer. Então me animei bastante quando comecei a entrevistar para vagas de vários países diferentes. E aqui já comecei a aprender algo novo: nascer em um país específico não determina seu potencial ou capacidade. Faz sentido quando pensamos, mas perceber isso na prática tem um peso maior. A régua alta que temos aqui é igual para todos e cada contratação deve fortalecer a cultura da empresa. Por isso, é uma supresa agradável ver que as vagas preenchidas mais rápido, talvez não eram aquelas que você esperaria no início. E que em alguns dos países mais desenvolvidos do mundo, pode ser difícil encontrar gente boa. Talento realmente não tem endereço. E num mercado de trabalho cada vez mais globalizado – onde pessoas trabalham para qualquer empresa, de qualquer lugar -, isso com certeza aumenta a confiança.
E olha só, talvez esta seja uma boa deixa para encerrar o texto. Voltando para a pergunta do início: “E aí, já se adaptou?”
– Não tenho certeza, mas estou confiante!






